[ ...] produzir um texto significa supor a sua recepção e, por consequência, a sua compreensão, ou seja, presumir que seja possível compartilhá-lo em comunidade [ ... ], mesmo que aspectos subjetivos estejam aí incluídos (particularidades de um dado estabelecimento escolar de um dos países ou singularidades idioletais de um tradutor, [por exemplo]).[ ... ]
Devido à diversidade das instituições de ensino, mesmo em sistemas mais centralizados,a principal função do tradutor não é encontrar um equivalente pleno, que muitas vezes não existe, mas encontrar técnicas para, por um lado, preservar o referente cultural e, ao mesmo tempo, torná-lo compreensível no texto traduzido(cf. Delvizio, 2011 p. 281). Consiste aí uma das dificuldades do trabalho do tradutor juramentado [neste caso específico, mas que não é diferente no trabalho do não-juramentado] (como, por exemplo, na tradução de abreviações, notas e menções, títulos de disciplinas, entidades institucionais, entre outros), que precisa evitar adaptações, pela própria natureza do texto que traduz,diversificando suas estratégias, entre transcrições, empréstimos, modulações,traduções intersemióticas, explicitações e até mesmo implicitações ou omissões(cf. modalidades tradutórias de Aubert, 1998). Por tal motivo, é frequente incluir explicitações ou paráfrases entre parêntesis ou em notas de rodapé precedidas de “N.d.T.” (Nota do Tradutor). [ ... ]
Num estudo sobre históricos escolares acadêmicos alemães e brasileiros, Reichmann (2013)constatou a grande diversidade na nomenclatura deste gênero textual no sistema alemão em oposição ao sistema brasileiro, que usa “histórico escolar” em todo o território nacional. Portanto, na Alemanha há termos concorrentes para denominar este documento escolar, como: Bescheinigung über erbrachte Studien-und Prüfungsleistungen, Notenspiegel, Leistungsübersicht,Leistungsbescheinigung, Leistungsnachweis, Transcript of Records, Datenabschrift,entre outros. Tal diversidade terminológica na Alemanha está estreitamente relacionada ao sistema escolar descentralizado em que cada estado ou instituição denomina o documento da maneira considerada mais conveniente, apesar de haver uma tendência à harmonização pela Reforma de Bolonha do uso de “Transcript of Records” e seus equivalentes em outros idiomas. [ ... ]
Desse modo, cabe ao tradutor juramentado fazer com que o estabelecimento escolar brasileiro que vai receber a tradução desse documento escolar compreenda-o, por um lado, quanto ao gênero e às terminologias e, por outro, a partir das equivalências instauradas pelo profissional das duas línguas, estabeleça um paralelo entre as marcas e os marcadores culturais dos dois países. Para tanto, o tradutor provavelmente incluirá notas de rodapé para explicitar as dissonâncias percebidas (no Brasil, por exemplo, as notas são atribuídas sobre 10 e na França, sobre 20) e se acomodará às singularidades dos discursos de cada gênero(os comentários dos professores franceses, por exemplo, vão do registro coloquial ao poético, passando por citações, provérbios e idiomatismos). [ ...]
Cabe,portanto, ao tradutor público ou juramentado [e a meu ver, também ao tradutor não juramentado] realizar pesquisas aprofundadas não somente sobre os gêneros,abreviações e terminologias em contraste, mas também sobre as especificidades de cada instituição emissora de determinado documento escolar no respectivo sistema de ensino [que no caso do tradutor não juramentado, se aplica a todo e qualquer texto literal, acadêmico, técnico, poético, dentre tantos outros que venha a transpor, linguisticamente, para qualquer que seja o idioma final desejado,em respeito à época e ao autor que o produziu, bem como ao contexto no qual foi produzido. [ ...]
A preocupação do tradutor em atualizar seus conhecimentos e aprimorar as técnicas de tradução é fundamental para que a sua tradução [juramentada ou não] possa exercer a função de veicular as marcas e os marcadores culturais de determinado sistema de ensino, [texto literário, histórico, acadêmico, técnico, poético,dentre tantos outros] de maneira compreensível para o receptor da tradução[seja ela juramentada ou não].
In: REICHMANN,Tinka & ZAVAGLIA, Adriana. A TRADUÇÃO JURAMENTADA DE DOCUMENTOSESCOLARES (PORTUGUÊS, FRANCÊS, ALEMÃO). Disponível em:http://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/trad_em_revista.php?strSecao=input5&fas=259.Acesso em: nov. 2014. / http://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/trad_em_revista.php?strSecao=input5&fas=259. Acesso em: dez. 2015.